Um Lugar Qualquer

.

Quando você tenta errar e consegue, você está diante de um paradoxo. Assim Sofia Coppola prepara a armadilha de "Um Lugar Qualquer". O filme é uma clara tentativa de personificar o tédio e o vazio. E consegue. É o puro elogio ao ócio. Não há pressa alguma aqui, desde o primeiro instante Coppola lhe alerta que mesmo um carro em alta velocidade não terá emoção alguma. Tal como seu protagonista Johnny Marco (Stephen Dorff), o ator mega star de filmes de ação que leva a vida em câmera lenta.

Pobre menino rico. Dinheiro, fama, mulheres, Ferrari, hotéis, tédio... E a eterna procura pelo seu Rosebud. Por algo que lhe coloque de volta ao mundo real e lhe dê o mínimo sentido na vida. Uma procura silenciosa, é bem verdade. Aquele saber que está faltando algo e não saber exatamente o que, nem ao menos se esforçar para isso. Ele não vai atrás das respostas, apenas espera sonolentemente que elas cheguem a sua porta. E se você sabe que o protagonista tem uma filha, já deve ter ligado as pontas. 

Esperar é a sua verdadeira vocação. E desde o início da sessão você já foi alertado que as cenas possuirão a metalinguagem do seu protagonista. Se você não está enxergando direito, vem um zoom in a passos de tartaruga tentar lhe mostrar. Você será paciente, não será? Não há escolha. Então você vai até a cozinha, abre a geladeira pra pensar, não acha nada interessante, acaba pegando uma garrafa de água, fecha a geladeira, deixa a garrafa de água em cima da mesa, abre o armário, pega o copo, fecha o armário, coloca o copo em cima da mesa, coloca um pouco de água no copo, abre a geladeira, devolve a garrafa dentro, fecha a geladeira, pega o copo, bebe a sua água e decide voltar pra sala. E o zoom in ainda não acabou. Mas não se preocupe, apenas o tédio passou por ali, como sempre foi a proposta do filme.

Genial, não? Será? Coppola faz um filme tão receita de bolo quanto o de uma sessão da tarde. Mas há preguiça suficiente pra misturar os ingredientes.  Mas a proposta sempre foi essa. É deixar tudo em cima da mesa e com tempo suficiente pra você perceber que dali sairá algo. Já percebeu? Ok, era só isso. Pega-se o clichê, muda um pouco aqui, pinta diferente ali e voilá! Ou vai dizer que nunca viu um pai ausente dividindo sorvete com a filha, jogando guitar hero e esquecendo que ela já faz patinação há 3 anos? Coloque o nome de Sofia Coppola na frente e adicione cenas fragmentadas. Parece cult agora! 

Um lugar qualquer, que decide ir a lugar nenhum. E essa é a real intenção do filme. Tentar ser tedioso e conseguir. Um lindo paradoxo. Um poeta que se encanta (e se contenta) com o papel em branco. 


Um Lugar Qualquer
(Somewhere, de Sofia Coppola, EUA, 2010)
Com: Stephen Dorff, Elle Fanning, Chris Pontius, Karissa Shannon, Kristina Shannon.

10 comentários:

  1. Não sou a maior fã da Coppolinha, por isso assistirei a este filme sem qualquer expectativa...

    ResponderExcluir
  2. Hahaha, eu ri da relação do zoom in e o copo d'água na geladeira. Concordo com sua crítica, tem muitas cenas que ficam esparsas e não se completam. Acho que há formas de o diretor pintar o tédio sem ser tedioso - e isso me remete ao recente "Polícia, Adjetivo", que padece do mesmo mal deste filme.

    No entanto, há cenas bem bonitas, mas o tédio predomina total sobre a narrativa.

    abs!

    ResponderExcluir
  3. Kamila, é preciso é coragem pra assistir a Coppolinha tentando ser autoral.

    Elton, haha! É um tédio só, com fotografia bonita, tentando ser cult. Mas isso não é suficiente. E não assisti ainda "Polícia, Adjetivo", mas se for tão tedioso quanto, passo.

    ResponderExcluir
  4. Possivelmente o melhor texto que li sobre o filme.
    Concordo, como você já deve saber. Pura receita de bolo mesmo. Disse tudo.

    []s!

    ResponderExcluir
  5. Obrigado Jeff! Coppolinha precisa se esforçar mais na próxima mesmo.

    ResponderExcluir
  6. Eu gosto de "As virgens suicidas", acho que ali Dona Coppolinha acertou na receita de bolo!

    abraço

    ResponderExcluir
  7. Boa análise Victor, parabéns!

    O filme repete a fórmula que ela adora manipular, mas é inverossimel.

    ResponderExcluir
  8. Adorei o 'Coppolinha'. RSRS. Eu consegui me conectar com o filme, não é o melhor dela (eu gosto bastante dos seus últimos três filmes), acho experimental.

    ResponderExcluir
  9. Adorei o 'Coppolinha'. RSRS. Eu consegui me conectar com o filme, não é o melhor dela (eu gosto bastante dos seus últimos três filmes), acho experimental.

    ResponderExcluir
  10. Adorei o 'Coppolinha'. RSRS. Eu consegui me conectar com o filme, não é o melhor dela (eu gosto bastante dos seus últimos três filmes), acho experimental.

    ResponderExcluir

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...